Eternidades
I
Seu nome era Valdemar
Colega e aluno doutrinal
Dei com ele no alto mar
Encarpelado pelo mal
Confessa-me sua volição
Já mui arrependido então
Incrédulo pela relatação
Ainda tentei mas em vão
Que lhe provessem uma mão
Doou-nos suas abordagens
Seguiu para outras viagens
Decerto com mil vantagens
Deixando muitas friagens
II
Houve também o Lopes
Colega e aluno singular
Sempre de alma a sangrar
Nunca achou onde aportar
Desapareceu além-mar
Regressou para assentar
Compareceu ao altar
Mas não chegou a atracar
Retornado à sua origem
Perseguiu alta miragem
No mundo de libertinagem
Sem lobrigar ancoragem
Deixando porém boa imagem
III
Surgiu ainda o Inácio
Comunista mui humanista
Construiu em si um palácio
Esculpido como harmonista
Iluminou-o de sabedorias
Adereçou-o de benfeitorias
Emoldurou-o de alegorias
De imensas e belas iguarias
Mestre de mil formoseados
Inda hoje muito ilustrados
Cedo apercebeu sua ida
Sem qualquer raiva contida
Foi-se sem uma despedida
Deixando-me a alma fendida
IV
Chegou além o Carlos
Conhecido por Romão
Era uma alta distinção
Em multi polivalências
Nunca dizendo não
Mesmo às prepotências
Se foi prematuramente
Recusando ternamente
E muito calmamente
Cuidar da sua fronte
Pra não estar ausente
No agente. Assiduamente
Deixando-me horrente
V
Ainda existiu outro Lopes
Seus peitos eram dos Santos
Abusando de seus quebrantos
Questionaram seus afeitos
Jogaram-lhe com confeitos
Roubaram-lhe o remanso
Fazendo-o passar por tanso
Quando era apenas manso
Sofrendo como um servil frade
Desígnio da sua bondade
Exibiu sempre simplicidade
A todos oferecia amizade
Devotando generosidade
Deixando-me eterna saudade
VI
Surdiu um tal Senhor Brás
Foi um amigo de cartaz
Como meu patrão um ás
Só que um tal de Ferraz
Todo ele infiel capataz
Encordoou este cabaz
Perdemos as estimas
Metemo-nos em esgrimas
Fomos triviais vítimas
De nossas próprias frimas
Esquecendo as ateimas
Logramos novas enzimas
Mas já sem tempo pra rimas
Deixou-nos de almas vazias
VII
Fulgiu também o Carvalho
Era o Hélder no seu trabalho
Abrigo das minhas dúvidas
Alentou-me as desprazidas
Humorando com lambidas
Todas as minhas feridas
Olvidando seus desprazeres
Libertou-se dos afazeres
E purgado de malquereres
Resgatou suas filosofias
Amoldou-as aos seus lemas
E deixou-nos com dilemas
VIII
Existiu o amigo Luís
Que só pra me fazer feliz
Azul e branco foi por um triz
Demostrando seu belo cariz
Foi-se com muita sobriedade
Decerto incontendo na ementa
Quão intensa era a fatalidade
Com que legava sua tormenta
Estávamos no início das estimas
Já com várias e boas arrimas
Mas uma vez colhidas as vindimas
Deixou-me sem apetência de rimas
IX
Apareceu-me o Canedo
Homem sem medo
De farta inteligência
E repleto de paciência
Tarde soube sua partida
Não houve então despedida
Quedou-me arrependido
E deveras compungido
X
No noivado do Amial
Conheci um Horta jovial
Tratou-me tão bacanal
Pra sempre foi amical
Não mais inolvidei
Quem reparou em mim
Fez-me sentir rei
Inda era benjamim
Não se ficou por aqui
Tão logo lhe pedi
Acedeu ao desejo
Concedeu-me almejo
Foi meu almirante
Pondo sempre diante
Crença gratificante
Sustendo aliciante
Cercearam-lhe o destino
Talvez perdido o tino
Terminou esquecido
Por tanto desagradecido
Na sua última viagem
Já sem fina linhagem
Foi-se um bom amigo
Quedando-me mais mendigo
XI
Irrefragável dama
Emília era a chama
Sorria pras almas
Até pras mais infamas
Sua postura apurada
Manteve-se imaculável
Perante facto censurável
Sorria meiga não abrumada
Inopinamente feneceu
Foi quem mais se pareceu
Ao jeito de minha mãe estar
Eleita para me levar ao altar
Nunca declinarei seu recordar
XII
Inesquecível o Edgar
Ao início só pra gozar
Pois era um acriançar
Agarrado ao meu bazar
Meti-me por outro atalho
Esqueci-me do pirralho
Agindo como paspalho
Foi mesmo um enxovalho
Fugazmente o encontrei
Mesmo aí jamais me dei
Glosei-o com tontarias
Nessas curtas cantarias
Nos torvelinhos das vidas
Entrou-me portas adentro
Ignorava suas doídas
Deu-se insigne reencontro
Achegou-se logo a mim
Permitiu-me com afim
Redimir-me em frenesim,
Ofereci-lhe meu jardim
Contemplei sua revivescência
Com muita efervescência
Acreditei mesmo na servência
Da minha saudável valência
Amodorrou-se em sono de ouro
Caiu sonhando com o Douro
Perdi um amigo duradouro
Quando já havia um tesouro
Deixando-me deveras morredouro
JP/2014/Dezembro –versão completa